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Propriedade intelectual

Posted by Érika on Mar 16, 2010 in Isso me irrita

Desde que decidi me tornar tradutora, busquei na internet pessoas que tivessem a mesma profissão. Achava que em Belém não havia mercado nem profissionais na área –  ledo engano, já que a Região Norte tem uma demanda considerável pelo trabalho de tradução/interpretação (nada que se compare ao eixo Rio-São Paulo, mas muito superior ao que imaginava). Na verdade, tudo começou com a solidão e a saudade. Estava sozinha, numa cidade enorme, longe de parentes, amigos, colinho de mamãe (ah, esse é enorme… *suspiro*), buscando uma carreira nova, para a qual eu nem sabia se tinha talento. Apesar de empolgada, precisava ter um pezinho na minha antiga terra, para que não desmoronasse. Assim, decidi recriar o meu perfil no orkut. Na época, a maioria das pessoas achava essa ferramenta inútil (muitos realmente não sabem o que fazer com ela), e para mim, naquele momento, era apenas uma forma de me sentir “em casa”.

Um belo dia resolvi futucar e ver se havia algo sobre as novas profissões que queria. Achei a comunidade “Tradutores e intérpretes/BR”. Entrei, sentei e observei. Estava acontecendo uma confusão enorme. Tinha gente dizendo que sairia e nunca mais voltaria para aquele ambiente enquanto o outro insistisse em lhe irritar. Confesso que fui fuçar posts antigos (ah, a curiosidade…) para tentar entender os porquês. Não consegui e resolvi me “incluir fora” do barraco. Mas, uns meses depois voltei. Mais uma vez eu entrei, sentei e observei. Aí sim percebi que muitas pessoas se conheciam, pareciam amigos de infância. Brincavam e falavam de coisas sérias com uma agilidade tremenda. Lidavam bem com essa inclusão do pessoal no profissional. Pareciam muito experientes também.

Enxerida que sou, queria logo participar. Mas, como eu sempre digo, não podia chegar colocando logo os pés na mesinha de centro e abrindo a geladeira. Eu conhecia tão pouco sobre tudo no mundinho tradutório… Passei uns 2 meses só lendo e me inteirando das coisas. Bom, aí eu já sentia que podia dizer algo e tal. Logicamente que eu dava pitacos na galhofa (confesso que sou boa nisso). De galhofa em galhofa, acabei me enturmando, participando dos “orkontros”, eventos e projetos do pessoal.

Um deles foi a versão de tradutores do “Moleskine Project” (um projeto itinerante, em que cada um recebe um caderninho, um Moleskine, e em suas páginas faz um desenho). A ideia foi da Ieda Bispo, que se responsabilizou por coordenar o projeto, contando atualmente com a ajuda da Maria Clara Valinhas. O projeto conta com um blog (http://50302unplugged.wordpress.com/) em que registramos nossas “artes”.

Quis muito participar do projeto. Tive mil ideias, possibilidades e sentia um friozinho na barriga só de pensar na execução, de como ficaria, se os colegas gostariam, se ia ficar banal… Já tinha decidido o que faria. Mas aí vem a demora… O caderninho demora bastante para chegar. Dá uma ansiedade danada.

Um dia acordei com uma ideiazinha na cabeça. Ela surgiu logo após eu ter entregado um trabalho carne de pescoço ou bebê de Rosemary, como queiram. Havia trabalhado tanto num texto mal escrito, difícil e longo que pensei que jamais iria querer ter um mostrengo daquele nas mãos novamente (tolinha eu. Peguei vários desse tipo depois :)). Aí lembrei que tem paródias do “Pai nosso” para várias coisas, mas não sabia de nenhuma que nos livrasse dos pesadelos tradutórios (aliás, bem pensado. Vou catar no Google, talvez tenha uma oração para S. Jerônimo). Tive o insight e em menos de 10 minutos minha paródia estava pronta. Quando estive com o Moleskine em mãos, eu o levei para Belém – queria usar os lápis de cor do meu sobrinho. 😀 Aqui vocês podem conferir o resultado: http://50302unplugged.wordpress.com/2009/12/09/a-arte-da-erika/.

Para meu deleite, muitos dos queridos e respeitados colegas gostaram do meu texto. Alguns pediram para publicá-los em seus blogs e sites. Achei legal, seria divertido mostrar aos outros que passamos por problemas profissionais semelhantes (afinal, nós tradutores estamos sempre mergulhados em nossa vastidão interior…).

Não passou muito tempo e recebi a Oração por email, em uma lista. Pensei: “puxa, já chegou? Que rápido!”. Só que meu sorrisinho pueril por aquela pequena e significativa vitória se desfez  no instante seguinte: o texto veio sem cabeça. Não faltou parte alguma, veio inteirinho. Exceto, claro, de vir sem dizer quem teve a ideia. Atrevida que sou, tratei de mandar um outro email, demonstrando minha autoria, com o link inclusive. Recebi uma resposta meio difícil de engolir: “Me disseram que era seu, mas não tinha certeza…”. Nem para checar, né? Decidi deixar quieto, aceitar o pedido de desculpas.

Hoje, soube por uma amiga que a nossa Oração já tinha virado domínio público na internet. Oi? Como assim? Segui o mesmo procedimento: entrei no site, deixei comentário com link do blog do Moleskine, pedi que consertasse o “esquecimento”. Muitos amigos queridos fizeram o mesmo (aliás, aproveito o ensejo para agradecer de novo). Soube que o rapaz pediu desculpas e colocou o crédito devido, mas disse que recebeu sem autoria e repassou mesmo assim.

Agora, eu me pergunto: cidadãos conscientes repassam pseudo-fatos sem confirmação? A um tradutor profissional é dito que 2+2=5 e ele sequer tem a curiosidade e a responsabilidade de verificar se isso procede? É isso? Então devem ser as mesmas pessoas que não tomam Coca-cola com Menthos porque explode o estômago, que encaminham emails na esperaça de ganhar $100,00 da Aol, ou que têm medo de acordar numa banheira cheia de gelo, sem o rim direito.

Pode parecer pouco. Muitos vão até dizer que é bobagem, que o texto nem é isso tudo, que estou fazendo tempestade em copo d’água. Pode ser. Mas é meu. E de cara-de-pau ninguém gosta.

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